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A violência em Roraima é contra a imagem no espelho

Os venezuelanos encarnam o pesadelo real de que toda estabilidade é provisória e o pertencimento é sempre precário


Não se compreende a violência dos brasileiros contra os venezuelanos sem entender o que é estar na fronteira e se saber à beira do mapa, a borda como o precipício que lembra a quem se agarra ao lado de cá que há uma fera rosnando no desconhecido. Com exceção dos povos indígenas, a população não indígena de Roraima é formada por migrantes recentes, a maioria da segunda metade do século 20. E sempre chegando de um outro lugar em que o chão se tornou movediço embaixo dos pés. Muitos não desembarcaram em Roraima diretamente do lugar em que nasceram, mas antes tentaram pertencer a outros pontos do mapa e não puderam se fixar por falta de trabalho ou outras faltas. Quem alcança um estado como Roraima vindo das regiões mais pobres do Brasil —ou das porções mais pobres dos estados ricos— sabe que alcançou uma espécie de território limite. Dali pra frente não há mais para onde andar. Talvez o que um brasileiro de Roraima vislumbre num venezuelano desesperado e sem lugar seja o retrato de si mesmo. Uma velha foto bem conhecida empurrada para o fundo de uma gaveta da qual ninguém quer lembrar, mas que nunca pôde ser totalmente esquecida. Diante dos venezuelanos famintos, doentes e assustados, desejando desesperadamente entrar, a imagem se materializa como um espelho que é preciso destruir. O que destroem no corpo do outro é a imagem de si mesmos cujo retorno não podem aceitar.


Saiba mais em https://brasil.elpais.com/brasil/2018/08/27/opinion/1535381111_480467.html

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