Estudo desconstrói mito ruralista: preservar não prejudica Economia. Abre-se, ao contrário, nova oportunidade: Brasil poderia liderar combate a práticas predatórias e gerar empregos e inovação ligados à recuperação de florestas.
II. São baixos os custos do desmatamento zero
32. São irrisórios os prejuízos econômicos decorrentes do fim do desmatamento na Amazônia no plano nacional, embora, localmente, possam ser detectados impactos negativos para os que dependem destas atividades ilegais e predatórias. “Quais seriam os impactos sociais e econômicos caso adotássemos uma política de desmatamento zero?” Esta pergunta norteia o estudo publicado em 2017 pelo Instituto Escolhas, em colaboração com o IMAZON, com o IMAFLORA e com o Geolab da ESALQ/USP. A resposta é clara: “Se todo o desmatamento – e a consequente expansão da fronteira agrícola – no Brasil acabasse imediatamente, seja legal ou ilegal, incluindo terras públicas e privadas, haveria um impacto mínimo na economia do país. Isso significaria uma redução de apenas 0,62% do PIB acumulado entre 2016 e 2030, o que corresponderia a uma diminuição do PIB de R$ 46,5 bilhões em 15 anos, ou R$ 3,1 bilhões por ano”. Como lembra o estudo, é uma cifra irrisória: somente os subsídios para o Plano Safra foram de R$ 10 bilhões em 2017. Os 0,62% do PIB perdidos com o fim do desmatamento até 2030 são considerados como um custo social, pelo estudo.
33. As perdas nos próprios Estados visados pela interrupção do desmatamento seriam maiores que as nacionais. Enquanto os Estados do Sul, do Sudeste e do Nordeste têm, no cenário de desmatamento zero, declínio em seus PIBs inferior a 0,5% até 2030, na Amazônia o quadro muda: no cenário de desmatamento zero até 2030, o Acre perderia 4,53% de seu PIB, o Mato Grosso 3,17% e o Pará 2,05%.
34. Como se poderia esperar, um dos resultados do modelo aplicado no estudo é que as categorias menos qualificadas entre os trabalhadores da Amazônia são as que conhecerão as maiores perdas salariais, como resultado do fim das atividades predatórias e mal remuneradas às quais com tanta frequência estão vinculados. Tolerar a continuidade do desmatamento por razões supostamente sociais é perenizar atividades predatórias, na maior parte das vezes ilegais e associadas a condições de trabalho degradantes.
35. Outro resultado importante do estudo é que o aumento na produtividade da bovinocultura de corte e na de leite seria mínimo para compensar as perdas decorrentes do fim do desmatamento. A conclusão do Instituto Escolhas é que “zerar ou mesmo apenas reduzir o desmatamento e acabar com a expansão da fronteira agrícola no Brasil teria um impacto muito baixo na economia do país e praticamente sem perdas sociais”. As perdas previstas na atividade pecuária poderiam ser totalmente compensadas por melhorias muito graduais na produtividade.
36. O cumprimento do que o País anunciou publicamente em Paris em 2015 – a recuperação de 12 milhões de hectares de florestas até 2030 – é uma oportunidade para investimentos privados, mas é sobretudo um componente do fortalecimento das condições ambientais para a expansão da própria produção agrícola. Restaurar paisagens naturais, mostra recente relatório da The Nature Conservancy “tornou-se uma potencial cadeia produtiva do agronegócio”.
37. No que se refere à recuperação florestal seu ritmo não tem ido além de 100 mil hectares por ano. Isso corresponde ao cumprimento de 0,9% daquilo com o que o País se compro comprometeu na Conferência de Paris em 2015. Nesta velocidade serão necessários nada menos que 120 anos para cumprir a meta estabelecida. Além de seus benefícios ecossistêmicos, a economia da restauração florestal representa uma oportunidade de geração de empregos, renda e inovação na qual o Brasil tem condições técnicas de ocupar posição de destaque, no plano internacional. Se os sinais da política pública forem adequados, há “toda uma cadeia produtiva com seus diferentes segmentos (coleta e produção de sementes, viveiros de mudas, manutenção dos plantios, assistência técnica, monitoramento, etc.) hoje incipientes diante do cenário projetado para a atividade. Nos Estados Unidos, por exemplo, a recuperação de áreas gera l.126 mil empregos diretos, mais que as indústrias americanas de carvão, de madeira ou aço. A cada milhão de dólares investidos na atividade são gerados nada menos que 33 empregos.
38. Os investimentos necessários para o reflorestamento no qual o País engajou-se internacionalmente estão ao alcance de suas possibilidades econômicas. Segundo estudo do Instituto Escolhas, o custo de reflorestar 12 milhões de hectares varia de R$ 31 bilhões a R$ 52 bilhões, a depender dos métodos de restauração. No caso de maior custo, isso significa R$ 3,7 bilhões anuais em catorze anos, com a criação de 250 mil empregos e a arrecadação de R$ 6,5 bilhões em impostos. O gasto anual corresponderia a apenas 2,3% dos créditos do Plano Safra. É claro que se trata de uma cifra aproximativa e com inúmeras condições. Ela envolve apenas a Mata Atlântica e a Amazônia e não o Cerrado, onde não se dispõem de dados para fazer este tipo de cálculo. As informações que deram lugar a este número originam-se na indústria de reflorestamento. É provável que outras organizações (inclusive as comunidades que vivem no interior de áreas florestais) disponham de tecnologias capazes de baratear estas atividades, sobretudo no que se refere ao plantio de espécies nativas.
39. Uma das mais importantes condições para a redução substantiva do desmatamento na Amazônia é a melhoria do estado em que se encontram as pastagens no País como um todo e na região em particular. Por isso, o Brasil assumiu a meta voluntária, na Conferência Climática de Paris de recuperar 15 milhões de hectares de pastagens degradadas e expandir em 5 milhões de hectares a superfície dos sistemas de integração lavoura/pecuária/floresta, até 2020. Para isso seriam necessários investimentos entre R$ 27 e R$ 31 bilhões em recuperação de pastagens e de quase R$ 8 bilhões em sistemas de integração.
40. Em suma, as perdas decorrentes do fim do desmatamento recaem sobre atividades que uma sociedade democrática moderna deveria superar, ou seja, aquelas que se concentram em atividades extrativistas e na maior parte das vezes ilegais, distantes das inovações tecnológicas das economias contemporâneas. Estas atividades contrastam, como será visto a seguir, por aquelas que, de forma incipiente, porém promissora, se desenvolvem no interior de diversos tipos de Unidades de Conservação na Amazônia.
Fonte: Outras Palavras
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