Por sua coragem em escrever sobre cartéis de drogas e corrupção no México, a escritora Anabel Hernández é a primeira mulher a receber o Prêmio Liberdade de Expressão da DW.
A mexicana Anabel Hernández iniciou a sua carreira jornalística em 1993 – quando ainda era estudante universitária, trabalhou para o jornal Reforma. Nos anos seguintes, Hernández ganhou fama como principal jornalista investigativa de seu país, publicando numerosos artigos sobre corrupção governamental, abuso sexual e tráfico de drogas.
A revelação de fatos chocantes – também em dois livros sobre as ligações entre os membros do governo mexicano e os cartéis de drogas do país – teve seu preço: Hernández vive atualmente exilada na Europa. Depois de receber ameaças de morte, inclusive contra seus filhos, ela teve que fugir do México.
"Nestes tempos dramáticos da história mexicana, o silêncio mata homens, mulheres e crianças, representantes da sociedade civil e defensores dos direitos humanos, funcionários do governo e jornalistas", disse Hernández, em 2012, quando foi agraciada com o prêmio Caneta de Ouro da Liberdade da Associação Mundial de Jornais e Editores de Notícias (Wan-Ifra).
E acrescentou: "Mas também a quebra de silêncio pode ser mortal".
A destemida tenacidade com a qual Hernández se dedica ao seu trabalho jornalístico, revelando a corrupção e o abuso de poder no México, como também desafiando o constante perigo à sua vida e integridade física, foi reconhecido pela Deutsche Welle com o Prêmio Liberdade de Expressão 2019.
O prêmio foi recebido por ela nesta terça-feira (27/05) em Bonn, durante o Global Media Forum, maior encontro de mídia da Alemanha realizado anualmente pela DW na antiga capital alemã.
Por experiência pessoal, Hernández conhece os perigos aos quais estão expostas as pessoas no México, resultante da alta criminalidade. Seu pai, que a aconselhou a não se tornar jornalista, foi assassinado em 2000 na Cidade do México. Até hoje, o crime ainda não foi esclarecido – para Anabel Hernández, esse assassinato foi a força motriz de seu trabalho jornalístico.
Seu primeiro trabalho investigativo foi publicado em 2001. Ela investigou os gastos extravagantes durante a presidência de Vicente Fox, recebendo por esse trabalho o Prêmio Nacional de Jornalismo no México. No entanto, pouco tempo depois, o jornal Milenio, para o qual trabalhava, reteve outros artigos dela – um ato de autocensura, para não se tornar alvo de violência.
Hernández não se deixou impressionar. Ela continuou suas pesquisas, observando também a criminalidade cotidiana das ruas para aprender mais sobre os muitos crimes que permanecem desconhecidos na maior parte do tempo. Em 2003, ela foi homenageada pela Unicef, por sua cobertura do trabalho escravo e exploração sexual de meninas mexicanas em San Diego, Califórnia.
Guerra às drogas no México
Depois de cinco anos de investigações, em 2010, Hernández publicou o livro Los Señores del Narco. A publicação não apenas desmascara os que estão por trás dos cartéis de drogas, mas também mostra quão intimamente entrelaçado está o "sistema do narcotráfico" com o cotidiano mexicano.
O livro Mostra a cumplicidade de políticos, militares e empresários com os traficantes de drogas. "Para proteger todos eles, transformaram o México num cemitério", escreveu Hernández.
Essa divulgação detalhada da corrupção foi um best-seller – mas, ao mesmo tempo, trouxe à autora inúmeras ameaças de morte. Entre outras coisas, foram depositadas carcaças de animais decapitados em sua porta de casa, como disse Hernández à revista The Nation no final de 2013.
Dali por diante, ela precisou o tempo todo de guarda-costas. Mas as ameaças não vinham dos cartéis de drogas. "A triste verdade é que elas vieram do lado do governo, do mais influente chefe de polícia do México", relatou a jornalista.
Desaparecimento de 43 estudantes
Ela também usou as suas fontes da cena de drogas também no contexto do desaparecimento de 43 estudantes na cidade de Iguala. Isso resultou na publicação do livro La verdadera noche de Iguala em 2016.
Nele, Hernández reúne depoimentos e os compara com relatórios oficiais sobre o que aconteceu na noite em que os estudantes desapareceram. Seu livro proporciona a investigação forense de um massacre. Ele mostra uma conspiração de funcionários e militares corruptos que, com o apoio da gangue de traficantes, eliminaram estudantes desagradáveis a caminho de um protesto na Cidade do México.
O livro levou a autora a correr um perigo ainda maior de vida. Henández deixou o México e foi para os EUA. Lá ela participou do Programa de Reportagem Investigativa da Universidade da Califórnia, Berkeley, entre 2014 e 2016.
Também nos EUA, Hernández logo recebeu ameaças. "No meio da minha pesquisa, uma das minhas fontes foi assassinada em plena rua. Mas acho que é meu trabalho: estou convencida de que trazer alguma luz às trevas é mais importante do que a minha própria segurança", disse a jornalista no final do ano passado.
Atualmente, depois de deixar os EUA, Anabel Hernández vive na Europa.
Fonte: DW Notícias
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