O Brasil está perdendo capital político com as medidas do governo Bolsonaro sobre o meio ambiente. É a única área na qual o país era visto como 'soft power' global, escreve Thomas Milz.
Na quarta-feira (08/05), oito ex-ministros do Meio Ambiente publicaram uma carta aberta com críticas à política ambiental do governo federal. O documento trata do prestígio do Brasil e sua posição no cenário internacional. Mas "as iniciativas em curso vão na direção oposta à de nosso alerta, comprometendo a imagem e a credibilidade internacional do país", segundo a carta.
Atualmente, o mundo olha para o Brasil com um misto de preocupação e meneios de cabeça. O ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, por exemplo, anunciou cortes de 95% dos recursos para ações de combate aos efeitos das mudanças climáticas. Isso ocorreu exatamente no momento em que as Nações Unidas apresentaram o seu assustador relatório sobre a extinção global de espécies.
Porém, mais espantoso que o "timing" foi o fato de que, de qualquer maneira, o orçamento do ministério previa apenas R$ 11,8 milhões para a luta contra o aquecimento global. Enquanto alunos do ensino médio na Europa fazem greves por uma política ambiental melhor, o assunto parece não interessar a quase ninguém no Brasil. Pelo menos, não no governo.
Com isso, o Brasil joga fora o prestígio construído sob os ex-presidentes Lula e Dilma nas conferências internacionais do clima. Nessa época, na área do meio ambiente e das mudanças climáticas, o Brasil era um global player, um agente global. E, com isso, tinha nas mãos um poder de persuasão que dava peso ao país nas negociações internacionais. Será que, de fato, tudo isso está em risco?
Thomas Milz é colunista da DW Brasil
Talvez o presidente Bolsonaro tenha copiado de seu ídolo Donald Trump a maneira como se alinhavam bons acordos. Assim, talvez, ele consiga elevar o preço que os países industrializados estão dispostos a pagar para salvar as florestas brasileiras. É que uma coisa é certa: sem o Brasil, nenhum acordo global do clima realmente eficaz poderá funcionar.
Por outro lado, não é possível enxergar qual é o grau de racionalidade da política de Bolsonaro. Será que ele realmente acredita em teorias da conspiração que dizem que as Nações Unidas querem roubar a Amazônia juntamente com os povos indígenas brasileiros?
E até que ponto Bolsonaro, como presidente, se deixa influenciar por ofensas pessoais? Assim, ele divulgou na quarta-feira que quer fazer mudanças, por decreto, na Estação Ecológica de Tamoios. Apenas lembrando: foi lá que, em 2012, Bolsonaro foi multado por pesca ilegal. O fiscal do Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) responsável pela multa foi exonerado em março.
Agora, Bolsonaro quer transformar a região em torno de Angra dos Reis numa "nova Cancún no Brasil". O exemplo mexicano é conhecido pelas suas fortalezas hoteleiras de cimento e pelas áreas de lazer onde estudantes universitários americanos bebem até ficarem inconscientes durante as férias de primavera (o chamado spring break).
Será que a mais recente iniciativa de Bolsonaro é uma cruzada de vingança pessoal contra o Ibama e os ambientalistas impopulares? O presidente deve saber que nada atinge mais dolorosamente seus adversários políticos do que um ataque à natureza do Brasil. Cada árvore derrubada também é uma vitória contra o chamado "politicamente correto" tão odiado por ele.
Thomas Milz saiu da casa de seus pais protestantes há quase 20 anos e se mudou para o país mais católico do mundo. Tem mestrado em Ciências Políticas e História da América Latina e, há 15 anos, trabalha como jornalista e fotógrafo para veículos como o Bayerischer Rundfunk, a agência de notícias KNA e o jornal Neue Zürcher Zeitung. É pai de uma menina nascida em 2012 em Salvador. Depois de uma década em São Paulo, mora no Rio de Janeiro há quatro anos.
Fonte: DW Notícias
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